Índios de Dourados e Sidrolândia, em Mato Grosso do Sul, serão os primeiros em todo o país a participar de cursos de capacitação criados especificamente para eles. O desemprego na região, sobretudo por causa da mecanização da lavoura de cana-de-açúcar, fez com que as lideranças reivindicassem a qualificação por meio do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec Brasil Sem Miséria). Os primeiros cursos devem começar em outubro.
Os indígenas estão fazendo o levantamento, nos dois municípios, sobre as principais necessidades dos grupos, que serão encaminhadas ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), coordenador do Brasil Sem Miséria. Em todo o estado existem 73 comunidades indígenas, que abrigam 71 mil pessoas. Estima-se que pelo menos 10 mil deles trabalhavam com o corte da cana-de-açúcar no estado.
O Pronatec Brasil Sem Miséria é uma parceria do MDS com o Ministério da Educação (MEC), destinado a pessoas acima de 16 anos que estejam no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal ou em processo de cadastramento e sejam extremamente pobres.
As aulas são ministradas por instituições de reconhecida qualidade no ensino técnico e tecnológico, como as unidades do chamado Sistema S (Senac, Senar e Senai) e a Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica. A qualificação é gratuita e os beneficiários recebem alimentação, transporte e material escolar.
Apenas em Mato Grosso do Sul, atualmente são 14,4 mil famílias inscritas no Cadastro Único – ou seja, público potencial desses cursos.
Metodologia –O Pronatec Brasil Sem Miséria ofereceu este ano mais de 300 mil vagas em cerca de 200 cursos em todo o país. Até o momento, não há qualificação específica alguma para as comunidades formadas por índios. Segundo o diretor de Inclusão Produtiva Urbana do MDS, Luiz Müller, os cursos terão metodologia específica para o público indígena, com uma forma diferenciada de acolhimento dos alunos. “Não vamos mudar os critérios para capacitar, por exemplo, um pedreiro, mas o modo de trabalhar com os alunos.”
A secretária de Estado de Trabalho e Assistência Social de Mato Grosso do Sul, Tânia Mara Garib, assinala que cada etnia tem sua particularidade e tendência de trabalho. Por isso, segundo ela, as demandas de cursos variam. Além daqueles entre 20 e 50 anos que trabalhavam nas lavouras de cana-de-açúcar, Tânia observa que há o problema dos jovens, que precisam ser qualificados e inseridos no mundo do trabalho.
Em Dourados, um primeiro levantamento apontou para a necessidade de qualificação em operação de máquinas agrícolas, técnicas agrícolas, biojoias, corte e costura, manicure e pedicure e panificação. Já em Sidrolândia, há pedido também para qualificação para trabalho em frigoríficos e construção civil. “Estamos aguardando a demanda oficial. Então, vamos conversar com os ofertantes e encaminhar ao MDS e MEC a implantação desses cursos”, diz Tânia.
Peculiaridades – De acordo com Müller, as comunidades tradicionais, quilombolas e indígenas têm peculiaridades. “É necessário entender que estamos no mundo do trabalho. Precisamos construir possibilidades de trabalho decente, por meio de uma capacitação profissional que ensine profissões que têm a ver com o mercado e que possibilitam real empregabilidade, associada também a conhecimentos mínimos sobre a legislação do trabalho”, ressalta. “Isso permitirá que esses índios tenham trabalho digno e decente a partir de agora.”
O indígena Euzébio Brites Garcia, da comunidade Pororó, em Dourados, cortou cana-de-açúcar durante 14 anos. Há pouco mais de um ano, passou a trabalhar como pintor de máquinas. Como não tinha qualificação, foi difícil conseguir uma nova ocupação. No corte de cana-de-açúcar, ele conseguia renda maior. “Para eu voltar a cortar cana, tenho de fazer curso. Se tiver curso para eu voltar, eu volto.”
Apesar de ainda não existir um Pronatec voltado para as comunidades indígenas, alguns índios já fizeram cursos do programa no estado. Em Dourados, 11 indígenas cursaram o Pronatec Brasil Sem Miséria. Magna Freitas Correia, da aldeia Jaguapiri, foi uma dessas pessoas. Ela fez o curso de panificação. “A gente foi para montar um negócio, porque não tem padaria aqui dentro. Isso me ajudou muito. Hoje trabalho na área fazendo pão. Aprendi também a fazer bolo de festa”. Ela contou que faz as encomendas em casa e o marido vende. Antes da qualificação, ela havia sido boia-fria em lavouras de feijão e milho e merendeira.
Cadastro – Os indígenas estão sendo incluídos no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal para que possam ter acesso às políticas sociais, informa a secretária estadual de Trabalho e Assistência Social. “Temos certeza que, na medida em que estamos inserindo-os, estamos abrindo perspectivas.” Isso porque, segundo ela, as duas cidades – com grande concentração de indígenas – são as que têm mais pobreza. Atualmente, em todo o país 83,6 mil famílias indígenas são beneficiárias do Programa Bolsa Família, sendo 11 mil em Mato Grosso do Sul.
Tânia destaca ainda que muitos índios procuram qualificação e emprego, mas são discriminados por serem indígenas. Como o Pronatec Brasil Sem Miséria é uma ação de inclusão produtiva – ou seja, os alunos são capacitados e, ao mesmo tempo, encaminhados para vagas de emprego –, ela acredita que esta realidade social vai mudar. Segundo a secretária, a ideia com o projeto-piloto é que se aprenda e se construa, a partir dele, qualificação profissional específica para essas comunidades. Depois do projeto piloto, completa Müller, os cursos específicos para os indígenas podem ser estendidos a todo o país.
Ascom MDS